Quando um bebé olha para a cara
da mãe, ele reconhece-a, ri-se e adora aquela pessoa que cuida e dá afeto. Ele
gosta dessa cara apenas porque cuida dele? Não. Reconhece-a porque cuida em
todas dimensões do seu desenvolvimento e porque fala com ele através das
expressões. Ele vai então ligar-se a essa pessoa de forma visceral. Com ela vai
começar a tornar-se uma pessoa e vai aprender muitas coisas, uma delas é a
comunicar. Comunicar verbalmente apenas? Não. Vai aprender a comunicar
principalmente com o corpo e muito particularmente com as expressões faciais. A
enorme quantidade de músculos na zona facial, permitem uma riqueza de
comunicação expressiva imensa. Nós não nos apercebemos disso, mas basta
experimentar olhar para uma pessoa que fala, e depois apenas ouvi-la.
Parece muito mais difícil
perceber o que ela diz, fazemos um maior esforço para entender. Porque falta
uma parte essencial da comunicação que é universal. Apesar de ao longo da vida
nós passarmos a usar preferencialmente a escuta e depois a oralidade, o corpo
mantém-se sempre como a nossa natural e básica forma de aprender e comunicar.
Acredita-se que a comunicação foi a vantagem biológica que nos permitiu evoluir
de um primata, para o que somos hoje e que essa capacidade de um núcleo
familiar, permitiu dominar a planeta, ao ponto de todos descendermos dele.
Organizar uma caçada,
transmitir qualquer tipo de conhecimento, gerir uma comunidade, passou a ser um
ato essencialmente de comunicação, que desenvolveu em espiral todas as
dimensões do nosso desenvolvimento. Assim acontece também com cada um de nós,
pois começamos a ser pessoas pela comunicação com alguém com quem estabelecemos
laços de vinculação.
Olhar para a cara de uma pessoa quando
comunicamos com ela diz-nos muito mais do que apenas ouvi-la. Aliás,
conseguimos até perceber aquilo que ela não nos está a dizer. É pela expressão
facial que nós lemos a luz interior, a beleza e as emoções. A cara, é uma
extraordinária máquina de comunicação, que permite até falar sem voz.
E como aprendemos a comunicar
pela cara? Como aprendemos a comunicar no geral, pelo contacto muito íntimo com
outras pessoas. Esta maravilhosa tecnologia biológica que é a nossa cara é a
base das nossas relações, afetos e é fundamental para a nossa evolução
positiva. Uma sociedade de cara tapada, perde tudo, desaprende tudo, amputa
grande parte daquilo que somos.
Pensar que a partir de agora e até sabe-se
lá quando, vamos andar de máscara em situações sociais, é aterrador. Pensar que
vamos conseguir ensinar crianças e jovens a conhecer o mundo e a
relacionarem-se com os outros, bem como a comunicar plenamente, é um engano. É
triste este novo mundo, onde não veremos a cara dos outros. É contra toda a
nossa natureza como espécie e contra a nossa própria integridade individual.
Ninguém se torna humano numa sociedade de caras tapadas.
É por isso que vejo com
enorme tristeza os dias que se avizinham e com preocupação a abertura das
escolas em setembro, onde, com o chegar do inverno, muito possivelmente
estaremos todos de máscara e afastados uns dos outros. Isso não é escola, não é
educação. Mas mais preocupado fico com os bebés nas creches e nos jardins de
infância. Não podemos ter bebés em creches oito horas por dia durante os principais
meses das suas vidas com cuidadores de cara tapada, porque essa é toda a
negação da nossa humanidade e perdem-se meses fundamentais no seu
desenvolvimento, que nunca mais serão recuperados. Uma situação potenciadora de
problemas. Isto sem falar que, até ao ano e meio a dois anos, o lugar das
crianças é com a mãe, ou com a sua figura de vinculação que representa esse
vínculo afetivo fundamental.
As creches já por si
representam um mal menor, numa sociedade que obriga as pessoas a abandonarem os
seus filhos para poderem trabalhar, mas tornar esses lugares tenebrosos e
agressivos para o desenvolvimento de uma criança, colocando máscaras em todas
as caras, deveria ser muito pensado. Na minha opinião, como sociedade,
deveríamos proteger a essência da nossa espécie e o bom desenvolvimento das
nossas crianças, permitindo melhores condições para as famílias cuidarem dos
seus bebés. Isto sim, seria uma solução promotora de uma futura geração bem
desenvolvida e afetivamente bem preparada. Antes de pensarmos em creches e
soluções de cara tapada, pensemos no apoio à parentalidade e à natalidade,
dando aos pais a possibilidade de criarem e educarem os seus filhos, numa fase
tão delicada e que marca de forma definitiva o nosso desenvolvimento enquanto
seres humanos.
Sem comentários:
Enviar um comentário